O professor Guerreiro Ramos, em seu clássico ensaio “O negro desde dentro”, chama a atenção […]

O professor Guerreiro Ramos, em seu clássico ensaio “O negro desde dentro”, chama a atenção para o fato de tomar-se como “naturais” categorias de pensamento e reflexão européias. Entre elas, o fato de ter-se por positivo tudo o que se liga à cor branca (símbolo do belo, do excelso e do sublime) e, ao contrário, por negativo, tudo o que se refere à negra (como ilustram os termos “lista negra”, “missa negra”, “alma negra”, “câmbio negro” entre outras).

Estas estruturas de pensamento vão de encontro com a realidade histórico-social do povo brasileiro e, por efeito, produzem uma profunda alienação estética nos, para Guerreiro, “homens de cor” em sociedades europeizadas como a brasileira. É quando se liberta das categorias “brancas” criadas para pensar uma realidade “negra” (e humana) é que o intelectual cumpre o seu papel de crítico das categorias dominantes. Temos aqui, evidentemente, uma releitura do movimento da negritude francesa, iniciado por Aime Cesaire, Leon Damas e Leopold Senghor, que inspirou o filósofo Jean Paul Sartre a escrever outro conhecido ensaio, Orfeu Negro. O projeto da negritude brasileira sucumbiu junto com o TEN e a sua liderança (Abdias do Nascimento e Guerreiro Ramos), perseguidas pelo regime ditatorial de 1964. No entanto, deixou as sementes do movimento negro contemporâneo que floresceu a partir dos anos 1970.

O que justifica este preâmbulo? Em primeiro lugar, ele faz uma menção ao documento assinado por dezenas de militantes psolistas, negros e anti-racistas, intitulado Um Sol Negro Está Nascendo. Apesar de pouco conhecido e divulgado entre a militância psolista, ele reflete a unidade de um importante setor do partido que pensa a luta negra e anti-racista como estratégica para a construção de nosso projeto de sociedade socialista.

Em segundo lugar, o 1º Congresso do PSOL aprovou a criação, entre outros como o de indígenas, mulheres, meio ambiente, juventude, GLBTT e Pessoas Portadoras de Deficiência, do Setorial de Negros e Negras. Durante o 1º Congresso, nós, negros e negros psolistas, realizaremos uma série de reuniões onde aprovaremos resoluções conjuntas e definiremos como principal atividade a realização de um Seminário Nacional de Negros e Negras, para aprofundarmos as nossas formulações estratégicas acerca da luta antiracista, do movimento negro e do socialismo que queremos.

Antes, porém, é importante assinalar que para nós, negros e negras psolistas, não é importante ter uma voz à esquerda que nos represente: queremos mais, queremos falar sobre a esquerda, da esquerda, na esquerda, enfim, por nós mesmos (e sermos escutados). Ao falarmos por nós mesmos, como negros e negras, colocamos em suspeição a brancura das categorias europeizadas feitas para pensar uma realidade que não é a nossa e estabelecemos um canal dialógico (político e pedagógico) de reflexão e síntese permanente entre o pensamento e a realidade que queremos transformar.

A sinalização do partido é importante e temos a convicção de que será real, ou seja, que estamos construindo um partido com disposição de lutar com os negros e não para os negros. Portanto, o PSOL deve ser parceiro dos que lutam contra o racismo, o sexismo e a homofobia e incitar os negros e negras em geral a se organizar e lutar por uma sociedade sem racismo e exploração.

Fábio Nogueira de Oliveira é sociólogo, membro da Comissão Nacional do Círculo Palmarino e do Setorial de Negros e Negras do PSOL.

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Professor Adjunto da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Doutor em Sociologia pela USP (2015), possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (2002) e mestrado em Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense (2009). Durante seu doutorado, foi Pesquisador Colaborador Visitante da Universidade de Princeton e Pesquisador do Museu Nacional José Martí / Universidade de Havana. Desenvolve pesquisas nas áreas de Teorias Críticas e Negritude e é membro do Grupo de Pesquisa CELACC/USP. É autor de Clóvis Moura: trajetória intelectual, práxis e resistência negra (Eduneb, 2015).

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